Friday, October 3, 2008

PEQUENOS GRANDES LUTADORES

Cada vez mais, mesmo os bebés mais prematuros conseguem sobreviver e com qualidade de vida mais elevada.

A prova disto é o que acontece actualmente na Unidade de Neonatologia do Hospital Central do Funchal (HCF). No ano passado, nasceram no HCF 348 bebés com menos de 37 semanas de gestação (13,5% do total de partos). 62 tiveram de ser internados na Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN) devido à prematuridade (dois deles nasceram com menos de 28 semanas e com peso inferior a um quilograma).

Já no primeiro semestre deste ano nasceram no HCF 190 bebés prematuros (15,8% do total de partos registados até à data). José Luís Nunes, médico pediatra e responsável pela Unidade de Neonatologia sublinha com satisfação que, este ano, e até ao momento, não se registou no HCF qualquer óbito num recém-nascido, de pré-termo ou de termo.

Se há algumas décadas, o limite da viabilidade era superior às 30 semanas de gestação, hoje já se coloca nas 24 semanas. É certo que, explica José Luís Nunes, quanto mais prematuro maior é o risco, até porque a grande prematuridade implica que os bebés têm menores "condições estruturais e orgânicas". Mas o cada vez maior e melhor conhecimento clínico, a melhoria nos equipamentos e tecnologias, os medicamentos mais eficazes como os corticóides pré-natais e o surfatante (para a maturação dos pulmões) têm permitido não só uma melhoria da "sobrevida, mas da qualidade de vida que é dada a estas crianças". Estes aliás serão alguns dos temas abordados hoje e amanhã numa reunião científica que terá lugar na biblioteca do HCF (vide destaque ao lado).

O responsável refere também que apesar dos constrangimentos do espaço da própria unidade, "o sucesso que se tem sentido deve-se especialmente à coesão da equipa médica e de enfermagem".

Também os cuidados obstétricos têm a sua quota parte de responsabilidade na diminuição da mortalidade e morbilidade dos prematuros. "Neste momento a maioria das gravidezes na Região são vigiadas", explica José Luís Nunes. Uma das maiores razões para um parto pré-termo são as infecções maternas. Quando a gravidez é vigiada, as infecções são detectadas mais cedo e o risco de prematuridade passa a ser menor. "Ter uma gravidez vigiada é fundamental para prevenir a prematuridade", diz o médico que apela também a que quando uma grávida se sentir mal, com perdas de líquido ou sangue, deve procurar rapidamente apoio clínico.

E embora rejeite a ideia de que trabalhar numa UCIN não implica assistir a milagres quase diários ("hoje estamos mais rotinados e preparados", admite), José Luís Nunes deixa escapar um sorriso de satisfação quando revela ao DIÁRIO que estão actualmente internados na Unidade, e ambos bem, um bebé que nasceu com 840 gramas e outro com 742 gramas. Nenhum deles consegue porém bater o recorde de um bebé do sexo masculino que há cerca de dois anos nasceu com 26 semanas de gestação e apenas 495 gramas. Hoje é um menino perfeito, saudável e feliz. Uma vitória que quase poderia ser um milagre.

Um quilo e meio e 37 centímetros Aos 25 anos, mãe pela primeira vez, Paula Alexandra nunca pensou que o seu filho nasceria antes da data prevista. Bernardo deveria nascer na última semana de Agosto passado, mas no final de Maio, uma perda de líquido amniótico levou-a até ao Hospital. Quando lá chegou, o diagnóstico foi de uma ruptura da 'bolsa' e Paula Alexandra ficou logo internada. "Não fiz nada para que o Bernardo nascesse antes de tempo", afirma. "Aconteceu". Durante cerca de três semanas, as equipas médicas e de enfermagem conseguiram 'segurar' a gravidez, mas no dia 21 de Junho, o Bernardo decidiu que era a hora certa para nascer. "O parto não foi provocado. Foi ele que quis nascer," diz a mãe.

O parto foi normal e sem epidural mas o pior foi o de facto de mal ter visto o filho. "Logo que o Bernardo nasceu foi para a incubadora", recorda. Os médicos e enfermeiros explicaram que a mãe não poderia estar logo com o filho. Seriam necessárias seis horas, as suficientes para realizar todos os exames médicos e saber se o Bernardo estava realmente bem. "Para acalmar a ansiedade, trouxeram-me uma fotografia dele". No final da tarde, Paula Alexandra pode finalmente conhecer o seu filho. Já estava à espera que ele fosse pequenino. Os números já eram sabidos: 37 centímetros de comprimento e cerca de um quilo e meio de peso. O primeiro impacto foi o de ter medo de pegar no bebé ao colo, mas a emoção da maternidade falou mais alto do que qualquer receio.

Dois dias depois, Paula Alexandra teve alta hospitalar, mas o filho não pode sair com ela. Durante três semanas, a UCIN foi o 'lar' de Bernardo e não passou um dia em que mãe não o visitasse. A rotina era a de dar banho (inicialmente com apenas uma compressa húmida), alimentá-lo (primeiro com sonda, depois com o biberão), mudar fralda e, depois, pegar ao colo, deixá-lo dormir contra o peito... Ao fim de três semanas na UCIN e mais alguns dias no berçário normal, Bernardo foi com a mãe para casa.

Hoje, passados pouco mais de três meses, Paula Alexandra já mal se lembra de que o filho nasceu prematuro. "Se colocarmos o Bernardo ao lado de um bebé de termo certo e que tenha também agora três meses, notamos que ele é mais pequeno, mas em termos de desenvolvimento não se nota qualquer diferença", explica a mãe. "Ele faz tudo o que faz um bebé com três meses. Já ri, já come perfeitamente, brinca muito com as mãozinhas, dorme bem... É um bebé calmo, mal chora. Corre tudo às mil maravilhas", acrescenta com um sorriso.

E embora tenha um acompanhamento médico ligeiramente diferente de um bebé de termo, com as Consultas de Neonatologia no HCF e o acompanhamento mais especializado (ao nível da oftamologia, otorrinolaringologia e desenvolvimento), o facto de ter nascido dois meses antes da data prevista não faz de Bernardo um bebé diferente dos outros, apenas com mais 'garra'.

Reunião começa hoje

É já a partir das 9h30 de hoje que se inicia a reunião científica 'A Grande Prematuridade: da Viabilidade à Alta', um encontro organizado pela Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais e Pediátricos (UCINP) do Hospital Central do Funchal e pela Secção de Neonatologia da Sociedade Portuguesa de Pediatria e que decorre até amanhã na Biblioteca do Hospital Cruz de Carvalho.

Segundo José Luís Nunes, responsável pela UCINP, o objectivo destas jornadas é o de "abordar o problema do dia-a-dia da unidade que é também o dia-a-dia dos grandes prematuros".

Ao longo do dia de hoje e de amanhã, os participantes na reunião científica irão usufruir de palestras "essencialmente práticas" e porque como estarão presentes vários médicos ligados às Unidades Neonatais dos principais hospitais do país, será uma oportunidade para que possa haver uma troca de experiências, entre os profissionais da Região e aqueles que vêm do exterior. Na reunião serão abordadas todas as fases de acompanhamento de um bebé pré-termo numa unidade hospitalar. As jornadas iniciar-se-ão deste modo com uma abordagem aos 'Problemas éticos no limite da viabilidade', seguindo-se o acompanhamento perinatal (antes do nascimento). Ainda durante a manhã, os especialistas vão falar sobre a temática da ventilação e das estratégias protectoras dos bebés pré-termo e, à tarde, será tempo para abordar a estabilização hemodinâmica e o suporte nutricional destas crianças, seguindo-se a apresentação de vários casos clínicos.

Amanhã, serão abordadas a conduta médica e cirúrgica no caso da enterocolite necrotizante e os factores prognósticos de sequelas neurosensoriais. A reunião não poderia terminar sem que se falasse sobre o seguimento após a alta hospitalar e a vigilância em ambulatório (intervenção precoce).

A sessão de abertura do evento está marcada para as 15 horas de hoje.
Fonte: DN

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